Coelho Neto: sesquicentenário de nascimento

Inicio esta homenagem a Coelho Neto, apelando aos professores e diretores das nossas escolas para que lembrem aos alunos a importância de comemorar-se o sesquicentenário desse escritor maranhense, nascido em 21 de fevereiro de 1864, na cidade de Caxias, e que tão bem representou o Maranhão, como deputado e como homem de letras, sempre com honradez e singular competência.

Enquanto vivo, da mesma forma que seu amigo Humberto de Campos, Coelho Neto recebeu o reconhecimento e a consagração, como escritor, como orador e como conferencista. Por muito tempo, foi o escritor mais lido do Brasil, recebendo, em 1928, o título de Príncipe dos Prosadores Brasileiros. Depois de morto, com pouco tempo, foi condenado ao esquecimento. Até agora, só conheço duas biografias dele: uma pequena, escrita por Paulo Dantas; e outra, maior, da autoria do seu filho, Paulo Coelho Neto, em 1942. Falta a grande biografia, que tantos escritores já mereceram, o que é lamentável, considerando-se a intensidade da sua vida.

O prestígio de Coelho Neto, como orador, era confirmado em cada discurso que pronunciava por todo o Brasil, abordando qualquer assunto. Até para a inauguração de uma piscina, na sede do seu clube de futebol, o Fluminense, ele foi convidado, e ali fez um emocionante discurso. Por sua paixão pelo futebol, estimulava os filhos a praticarem esportes, inclusive dois deles chegaram a jogar em times cariocas. Muitas de suas crônicas foram dedicadas ao futebol, sempre procurando mostrar o lado positivo desse esporte.

A bibliografia do autor de Turbilhão é vasta, com mais de cem obras, entre crônicas, romances, teatro, novela, contos, conferências e discursos. Sua produção de crônicas foi caudalosa. Calcula-se que tenha escrito mais de oito mil crônicas, que, se fossem reunidas em livros, dariam aproximadamente uns cem volumes.

O crítico literário Wilson Martins, já falecido, em crônica intitulada “O grande injustiçado”, publicada no Jornal do Brasil (Caderno Ideias, de 4.7.2009), fez uma inteligente análise da vida literária de Coelho Neto, considerando-o “o grande ficcionista, autor de dois ou três dos nossos melhores romances e de alguns contos modelares esquecidos dos nossos antologistas”. Informa, também, o cronista acerca da influência do escritor maranhense sobre Guimarães Rosa, que o considerava como o grande injustiçado de nossas letras.

O movimento modernista de 1922 escolheu o autor de Rei negro como o símbolo de tudo o que havia de retrógrado na literatura brasileira e passou a atacá-lo reiteradamente, pelo seu estilo e suas ideais. Impetuoso como sempre foi, Coelho Neto expandia seu estilo sem se importar com a crítica e a atenção às exigências das mutações do tempo.

No célebre discurso de Graça Aranha, também maranhense, rompendo com a Academia Brasileira de Letras em favor dos modernistas, estava presente, em posição contrária, Coelho Neto, que rebateu com veemência as palavras do autor de Canaã. Intitulando-se, nessa ocasião, como o último heleno, Coelho Neto saiu carregado nos braços dos seus amigos, enquanto Graça Aranha era levado pelos jovens modernistas.

O que motivou o esquecimento de Coelho Neto, considerando que sua produção não se restringiu à crônica? A resposta unânime dos críticos remete para o preciosismo do seu estilo, ao excesso de erudição do escritor, ao uso constante de palavras difíceis e desusadas. Em parte, tinha razão a crítica, mas o conteúdo de suas crônicas, o valor literário de suas produções demonstram a injustiça dessa campanha contra ele. Não se pode deixar de considerar que sua vida foi pautada pelo esforço contínuo pela sobrevivência e por causas elevadas, como a campanha abolicionista, na qual teve notável atuação.

Outro ponto positivo, na vida pessoal de Coelho Neto, é a constatação de sua capacidade de cultivar amizades. Faziam parte do seu grupo de amigos os escritores Olavo Bilac, José do Patrocínio, Luis Murat, Muniz Barreto, Pardal Mallet, Guimarães Passos, Paula Ney e Aluísio Azevedo. Posteriormente, acrescentaram-se a esse grupo os nomes de Humberto de Campos e Euclides da Cunha. Em seu livro A conquista, em que aparece com o pseudônimo de Anselmo Ribas, narra fatos da sua vida na Corte, em companhia dos seus amigos. Aluísio Azevedo é tratado com o pseudônimo de Ruy Vaz. Sua amizade com Machado de Assis levou-lhe a estar presente na hora da morte do autor de Dom Casmurro.

Coelho Neto foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras, onde ocupou a Cadeira nº 2. Na Academia Maranhense de Letras, é patrono da Cadeira nº 24.

Em seu Diário secreto (segundo volume), Humberto de Campos relata os últimos dias da vida do seu amigo, as agruras do seu sofrimento, que se findou em 28 de novembro de 1934. Sete dias depois, estava morto também o autor de Memórias inacabadas. Do mesmo modo que seu amigo, Coelho Neto passou sérias dificuldades para sustentar uma família extensa, com 14 filhos. Presume-se que, no período em que foi deputado federal, por três legislaturas (1909-1918), tenha gozado de relativa tranquilidade financeira. Mesmo exercendo outros cargos públicos, Coelho Neto morreu pobre, morando em casa alugada. Com Aluísio Azevedo e Humberto de Campos formou o trio dos sonhadores que pretenderam viver apenas do próprio trabalho de escritor. A minha faculdade essencial é a imaginação, diz Coelho Neto pela voz do seu pseudônimo Anselmo, nas páginas de A conquista. E prossegue: “Vivo a sonhar, as ideias pululam no meu cérebro e sinto que são as sementes antigas que se fazem floresta”.

Passados 150 anos do seu nascimento, o que restou desse incansável sonhador das nossas letras?

Publicada no jornal O Estado do Maranhão, em 23 de fevereiro de 2014.

Por: Lourival Serejo



Lourival Serejo

     Lourival de Jesus Serejo Sousa nasceu na cidade de Viana, Maranhão. Filho de Nozor Lauro Lopes de Sousa e Isabel Serejo Sousa. Formou-se em Direito, em
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