Nas prateleiras da Livraria Cultura, uma edição juvenil de O cortiço chamou-me a atenção: era um exemplar luxuoso, com capa estofada e impresso em papel acetinado, com várias fotos coloridas, tudo para atrair o interesse dos leitores jovens. Mais admirado fiquei ao constatar que o livro, embora trouxesse o selo de uma editora de Blumenau, havia sido impresso na China. Talvez, por isso, estava sendo vendido por apenas dez reais.
Esse fato vem confirmar o que, há muito, venho reiteradamente falando de Aluísio Azevedo ao apontar o fenômeno das sucessivas edições de suas obras, mesmo depois de cem anos do seu falecimento. É para lembrar essa data que me valho desta crônica.
Neste 21 de janeiro de 2013, comemora-se o centenário da morte de Aluísio Azevedo, que faleceu, com apenas 56 anos de idade, em Buenos Aires, assistido por sua companheira, Pastora Loquez, e seus dois filhos adotivos. A causa da morte foi atestada como miocardite. Posteriormente, em 1919, seu corpo foi trasladado para o Rio de Janeiro, vindo, em seguida, para São Luís, onde chegou em 25 de outubro daquele ano, sendo sepultado no Cemitério do Gavião.
O surpreendente, na vida de Aluísio Azevedo, é que ele deixou de escrever aos 38 anos de idade, depois de dedicar-se dezesseis anos à intensa atividade literária. Para efeito de comparação, José Saramago só se notabilizou como escritor aos sessenta anos de idade, ao publicar Memorial do convento, em 1982.
Em São Luís, Aluísio lançou, em 1879, seu primeiro romance, Uma lágrima de mulher, com marcas claras do Romantismo, que iria abandonar em 1881, com o romance O mulato, também lançado em São Luís, cuja obra inaugurou o Naturalismo no Brasil.
Concomitante a essa atividade de escritor, Aluísio Azevedo dedicava-se ao jornalismo, publicando artigos e crônicas pelos jornais O Pensador e Pacotilha. No primeiro, seus artigos eram de teor fortemente anticlerical, com veementes denúncias sobre a atuação da Igreja maranhense. Essa postura anticlerical ele levou para as páginas de O mulato, onde o cônego Diogo personificava o tipo deplorável do sacerdote.
No Rio de Janeiro, Aluísio junta-se ao seu irmão Arthur e começa a desempenhar várias atividades, publicando seus romances-folhetins, escrevendo nos jornais e compondo peças de teatro. A princípio, trabalhou como chargista em vários jornais (O Figaro, O Mequetrefe, Zig-Zag e A Semana Ilustrada). Como sabemos, ele era um exímio desenhista e tinha inclinação à pintura, sua primeira vocação assumida. Em sua temporada na Corte, aliou-se a um grupo de escritores que representavam a nata da literatura. Na obra A conquista, Coelho Neto retrata muito bem as atividades daqueles escritores pelos jornais e bares do Rio de Janeiro antigo.
Em 1890, lançou O cortiço, obra que continua até hoje como verdadeiro best-seller da literatura brasileira. Nos últimos anos, têm sido publicadas de cinco a oito edições anuais desse romance, por editoras diferentes, em todo o Brasil. A unanimidade dos críticos aponta O cortiço, ao lado de O mulato e Casa de Pensão como a trilogia que consagrou Aluísio Azevedo no cenário da literatura nacional.
Para consternação dos amigos e admiradores, Aluísio Azevedo deixou de escrever em 1895. Depois de publicar seu último romance, Livro de uma sogra, ingressou na carreira de diplomata, conquistada por concurso, passando a dedicar-se somente ao trabalho. Nesse período, escreveu apenas a obra O Japão, que só foi publicada postumamente.
Na Academia Brasileira de Letras, onde ingressou em 1897, Aluísio Azevedo ocupou a Cadeira nº 4, e é o patrono da Cadeira nº 2 da Academia Maranhense de Letras, hoje ocupada pelo confrade Waldemiro Viana.
Aluísio Azevedo não se notabilizou apenas no romance. Escreveu também peças de teatro, crônicas e contos, dentre os quais uma produção gótica considerável, destacando-se o conto Os demônios, considerado um dos precursores do fantástico na literatura brasileira.
Há muitos motivos para comemorar os 100 anos de morte de Aluísio Azevedo, um escritor que nunca foi esquecido, que continua sendo editado, que continua sendo lido e estudado e que, ao lado de Arthur, representou, com louvores, a inteligência maranhense do final do século XIX.
Não há dúvida de que o êxito da produção literária de Aluísio Azevedo deveu-se à concentração que ele dispensava a cada obra. Sua metodologia de trabalho era disciplinada e sua produção literária era antecedida de profunda pesquisa quanto aos assuntos que elegia como tema dos seus livros. Daí a aceitação que os leitores sempre demonstraram pelos romances de Aluísio Azevedo: refletem a alma, as angústias e os problemas reais do povo, sem a superficialidade que marca muitas obras ficcionais.
Em reconhecimento ao grande evento deste ano, a Academia Maranhense de Letras consagrou o ano de 2013 como o Ano Literário Aluísio Azevedo.
Por: Lourival Serejo
Publicada em O Estado do Maranhão, em 19 de janeiro de 2013
Lourival de Jesus Serejo Sousa nasceu na cidade de Viana, Maranhão. Filho de Nozor Lauro Lopes de Sousa e Isabel Serejo Sousa. Formou-se em Direito, em
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