Admirável mundo da filatelia

     Não sei de onde surgiu a ideia de colecionar selos. Foi de repente, como uma onda que envolveu os irmãos e alguns amigos, todos da mesma faixa etária.

     Passamos a vasculhar os envelopes antigos da casa e pedir aos parentes e amigos que nos ajudassem nessa busca. De maneira tosca, sem qualquer técnica, começamos a colar selos – alguns até valiosos – em cadernos escolares comuns, utilizando goma arábica e cola branca. O resultado foi que se danificaram muitos selos.

     Com o tempo, descobrimos as charneiras como uma técnica mais apropriada de colar os selos em cadernos sem pautas. Depois vieram os álbuns especiais, as pinças, as lentes e outros meios próprios de colecionadores verdadeiros.

     Muito nos serviu a troca de selos para encher o não-ter-o-que-fazer de uma cidade interiorana isolada, como era Viana naquela época. Ainda contávamos com o incentivo da Voz da América, que promovia um       clube filatélico, ao qual me filiei. Como comprovante dessa filiação, recebi  um selo dos Estados Unidos para lembrar a morte de Kennedy, fixado num cartão próprio, com a história do lançamento e do homenageado. Guardo essa peça filatélica com muito cuidado.

     Passado tanto tempo, ainda persisto nessa tranquila opção de lazer, acumulando vários álbuns distribuídos por temas.

     A filatelia é uma atividade que prestigia peças históricas, culturais e artísticas, em que se eterniza a evolução da humanidade. É um hobby da maior utilidade para a formação cultural de um jovem. É lamentável que a juventude não mais se interesse por abraçar essa modalidade de diversão. Prefere a intermitência dos jogos eletrônicos e o mundo abissal da internet.

     O Brasil foi o segundo país a emitir selos postais. Esse fato ocorreu em 1843, com a coleção conhecida como Olho de boi (hoje valiosíssima), consistente em três selos de 30, 60 e 90 réis. De lá para cá, a apresentação dos nossos selos, em todos os aspectos, alcançou um alto grau de perfeição e contribuiu para a divulgação das nossas aves, peixes, animais domésticos e selvagens, árvores e flores, com todo o colorido que a natureza nos ofertou. As Letras, a História, o esporte, a Medicina, a aviação, as cidades, são também temas que, ao lado do universo ecológico, vêm refletidos nesse admirável mundo dos nossos selos.

     Para demonstrar o valor dos selos, lembro-me de uma história que li num fascículo da enciclopédia Conhecer, há muitos anos, a qual falava da influência de um selo na construção do Canal do Panamá. Dizia que o referido canal seria construído na Nicarágua, mas um colecionador de selos mandou ao  engenheiro responsável pelos estudos sobre o futuro canal um selo em que aparecia  um vulcão em erupção, justamente na área escolhida para construção do canal. Não havia prova mais evidente. Essa história serve muito bem para mostrar a importância de um selo, capaz de ter provocado alteração no local escolhido para construção do canal que ligaria o Atlântico ao Pacífico.

     Nas asas desse assunto, destaco a homenagem que a cidade de São Luís acaba de receber  dos Correios, pelos seus 400 anos, com o lançamento de um selo comemorativo em que se destacam as carrancas da Fonte do Ribeirão, um bailante do bumba-boi, peças de azulejos, a Igreja da Sé e o Palácio dos Leões, formando um conjunto de arquitetura e expressões culturais que espelha nossa cidade.

     Antes desse, outros selos já celebraram São Luís e Alcântara. Contudo, é do meu conhecimento que, até o momento, apenas dois maranhenses mereceram uma edição de selo comemorativo: Coelho Neto e José Sarney. O primeiro, por ocasião do seu centenário de nascimento, em 1964; o segundo, como presidente da República, a exemplo de todos os últimos presidentes brasileiros que ocuparam esse cargo. Gonçalves Dias figurou num selo postal ordinário, de tamanho menor, sem muita importância para colecionadores. É lamentável que Artur Azevedo e Aluísio Azevedo não tenham merecido esse reconhecimento.

     A respeito de Aluísio Azevedo, há uma particularidade, em sua biografia, que se refere a uma carta que ele recebeu, em Vigo, na Espanha, de  Rodrigo Otávio, solicitando-lhe selos para sua  coleção. O romancista respondeu-lhe em versos, dos quais destaco estas quadras:

Pedistes selos?... Pois selos
Tereis os que apetecerdes,
Encarnados, amarelos,
Azuis e roxos e verdes;
Tê-los-eis grande, pequenos,
À farta postos à escolha,
Uns melhores, outros em folha.
[...]
Apenas receio amigo,
Que, à força de mandar selos,
Fique eu doido e vós, comigo,
À força de recebê-los!

     Segundo a terminologia usada no mundo da filatelia, o selo comemorativo não se confunde com o selo personalizado, hoje uma prática muito utilizada para registrar qualquer acontecimento, público ou particular. Desse tipo, até eu, por vaidade, já mandei confeccionar uma folha de selos  com minha imagem. O selo comemorativo, além da finalidade postal, serve para celebrar alguma data histórica, um evento notável ou prestar homenagem a alguma personalidade.

     Como as cartas perderam espaço para o correio eletrônico, muitos jovens, em breve, não saberão mais o que é uma carta. E sem carta, não há selo. Se alguém se mostrar interessado nessa opção de lazer, terá que ir aos Correios e, para tanto, precisará de motivação.

     É tempo de iniciar-se uma campanha para despertar, entre os estudantes, o interesse pelos selos, pela filatelia, como forma de lazer, de aprendizagem, de intercâmbio. Ainda vale a pena colecionar selos.

     Por último, é bom informar que, em setembro,  também foram publicados, pelos Correios, um conjunto de quatro selos, edição Brasil-Portugal, homenageando os poetas Fernando Pessoa e Cruz e Sousa, nos quais foi possível destacar fragmentos do poema Mar português, de Fernando Pessoa  (Ó mar salgado, quanto do teu sal/São lágrimas de Portugal!/Por te cruzarmos, quantas mães choraram/Quantos filhos/em vão rezaram!) e do poema Ser pássaro, de Cruz e Sousa: (Ah! Ser pássaro! ter toda a amplidão dos ares/Para as asas abrir, ruflantes e nervosas,/Dos parques através e dos moitais de rosas/Nos floridos jardins, nas hortas e pomares).

Por: Lourival Serejo



Lourival Serejo

     Lourival de Jesus Serejo Sousa nasceu na cidade de Viana, Maranhão. Filho de Nozor Lauro Lopes de Sousa e Isabel Serejo Sousa. Formou-se em Direito, em
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