É do conhecimento geral que ultimamente as águas do Rio de Janeiro têm sido visitadas por baleias que tomam rumos diferentes dos seus itinerários. Ou talvez queiram mesmo é passear em águas desconhecidas. O resultado desse desvio de rota tem provocado admiráveis cenas para os cariocas, que se deleitam com a dança desses cetáceos que podem atingir até 15 metros de comprimento e pesar de quatro a dez toneladas.
Evidente que as cenas desses saltos das baleias não poderiam escapar de serem filmadas por qualquer portador de um celular e imediatamente espalhadas pela internet. Foi um desses vídeos, filmado na praia de Itaipu, em Niterói, que me deixou deslumbrado. De repente, uma baleia salta com toda a sua exuberância e deixa-se ver inteira deixando à mostra seu largo dorso luzidio. Faz sua cambalhota e depois mergulha.
Ocorre que, na amplitude dessa imagem, um detalhe se apresentou, quase imperceptível, formando algo exclusivo como se tivesse sido preparado para completar o espetáculo maior. Foi justamente esse detalhe que me provocou a convertê-lo numa crônica.
Indiferente à exibição da baleia, passava, na mesma cena, um pato, tranquilamente nadando, sem qualquer constrangimento de ter sua pequenez comparada àquela massa gigante que se ergueu da água.
Enquanto a baleia mostrava metade do seu dorso e suas nadadeiras abertas, numa acrobacia de cinema, o pato nadava como se nada estivesse acontecendo. Será que alguém viu o pato? O contraste foi tão grande que tornou o pato quase invisível, tão invisível que não mereceu uma referência midiática. Como dizem os jornalistas, o pato só seria notícia se tivesse engolido a baleia.
Esse contraste que a cena da baleia e do pato nos oferece é um convite para avaliarmos que o disparate da apresentação física entre o cetáceo e o bípede de pena não retira deste o seu valor. A indiferença do pato – reparem que ele nem se assustou – diante da grandeza da baleia faz parecer que ele tem consciência de merecer o mesmo respeito que aquele ser enorme desperta por ser grandioso. Enquanto ela afunda, ele vive na superfície, nadando com a mesma naturalidade de quem anda numa avenida.
A divulgação de vídeos pelas redes sociais tem produzido efeitos positivos e negativos. Destaco aqui como efeito positivo até aqueles que, às vezes, mesmo sem áudio e sem legenda, fazem a gente rir. E alguns, mais sérios, levam a profundas reflexões, como é caso desse que nos ofertou a contradição do pato com a baleia.
Essa imagem encerra uma diversidade de dois personagens do mundo animal, a qual se reproduz no espaço humano, em nosso cotidiano. Cada pessoa é o que é, e como tal precisa ser respeitada. Em nosso círculo variado de pessoas é a alteridade (respeito pelo rosto do outro) que constrói a ética da convivência.
Por: Lourival Serejo
Lourival de Jesus Serejo Sousa nasceu na cidade de Viana, Maranhão. Filho de Nozor Lauro Lopes de Sousa e Isabel Serejo Sousa. Formou-se em Direito, em
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