Nossa Amazônia continua sendo um território verde, extensamente verde, e exuberante de natureza, manifestada na vegetação, na fauna e nas águas, tudo em abundância.
Imaginar esse mundo transformado num deserto só a literatura distópica é capaz de fazer com tanta perfeição. Geralmente os escritores optam por esse gênero a partir de um ponto vago da imaginação, que vai prosperando no decorrer do enredo. Outros, partem de um apoio concreto, de estatísticas, de previsões da futurologia e de avaliações científicas para montarem um mundo distópico assustador.
A Amazônia distópica enquadra-se na segunda hipótese. E o crucial é observar que esse apoio concreto já começou a se esboçar.
Duas obras da nossa literatura abordam numa perspectiva distópica o perigo que ronda a Amazônia brasileira. A primeira, já consagrada, é de autoria de Ignácio de Loyola Brandão: Não verás país nenhum. A segunda, mais recente, é a A morte e o meteoro, do escritor Joca Reiners Terron.
O enredo bem montado de Não verás país nenhum se desdobra sobre a cidade de São Paulo, como uma amostra do que estaria ocorrendo no Brasil. São Paulo aparece no romance como dominada pela vigilância dos civiltates – um tipo de polícia política – a serviço do Esquema, que suprimiu a liberdade dos cidadãos e instalou-se no poder. A cidade vive em clima permanente de carência de alimentos, transportes e saúde. Tudo é controlado nos mínimos detalhes pela elite corrupta que controla o poder.
Sobre a Amazônia, em especial, destaco o momento em que um ministro celebra pela televisão a notícia de que o país agora conta com uma das maravilhas do mundo: um deserto maior do que o Saara, um novo ponto turístico, com planícies amarelas, dunas e os leitos dos rios secos. Esse local é a Amazônia.
Em A morte e o meteoro, Joca Terron já encontra a Amazônia arrasada. O tema de sua obra distópica é resolver o problema de 50 indígenas da tribo dos kaajupukugi, sobreviventes do extermínio, que vivem isolados e estão com ameaça de extinção. A única solução encontrada foi conseguir asilo político no México, onde os indígenas ficarão alojados num vale montanhoso, na condição de refugiados políticos.
A distopia é o contrário da utopia, mostra lugares onde o sistema político suprimiu a liberdade dos cidadãos e não há espaço para invocar direitos individuais. Exagero de ficcionistas? Nem tanto. Vejam a obra de George Orwell, 1984, da qual muitos aspectos se concretizaram, em vários países. A ameaça das democracias modernas aponta para essas opções distópicas, auxiliadas hoje pelo avanço sofisticado da tecnologia de informação.
As queimadas incontroláveis da mata amazônica, o desmatamento que já atingiu uma área do tamanho da França, o avanço dos garimpos, o isolamento dos índios, enfraquecidos, sem apoio governamental, o agronegócio se expandindo e gerando o mesmo cenário que o escritor peruano Manuel Scorza descreve em seu livro Bom dia para os defuntos, tudo contribui para temermos que essas previsões distópicas um dia venham a acontecer.
Neste ano eleitoral, a força do nosso voto pode fazer alguma coisa para influenciar nesse estado de coisas.
Por: Lourival Serejo
Lourival de Jesus Serejo Sousa nasceu na cidade de Viana, Maranhão. Filho de Nozor Lauro Lopes de Sousa e Isabel Serejo Sousa. Formou-se em Direito, em
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