Antes, previno que este é um tema delicado para ser tratado por um leigo. A vantagem é que se cometer alguma impropriedade, serei perdoado exatamente por essa condição. Como advertiam os latinos, ne sutor ultra crepidam.
Ao fim da leitura do livro Homo Deus, uma breve história do amanhã, de Yuval Harari (Companhia das Letras), ocorreu-me apenas um adjetivo para resumi-lo: inquietante. Antes dessa obra, Harari notabilizou-se pelo best-seller Homo sapiens.
Demonstra o autor que todos os milagres atribuídos aos deuses antigos hoje são feitos pelo homem, tudo como consequência do desenvolvimento científico e tecnológico dos últimos anos.
Alerta mais: que os avanços da inteligência artificial levarão, num futuro breve, o homem a substituir Deus, inclusive estendendo a longevidade para séculos de vida, ou até mesmo conquistando a imortalidade.
Ao falar dessas inovações surpreendentes, pretendeu o autor chegar à conclusão de que o homem de hoje está atingindo a condição de um verdadeiro Deus, efetivando, assim, o veredicto de Nietzche de que “Deus está morto”. Diz ele: "Tendo elevado a humanidade acima do nível bestial da luta pela sobrevivência, nosso propósito será fazer dos humanos deuses e transformar o Homo sapiens em Homo deus."
Nas entrelinhas da obra, o autor, que é israelense e ateu, traz à baila o antigo debate entre fé e ciência, ou fé e razão, com a nova face amparada na evolução da biotecnologia e da inteligência artificial.
Diante dessas profecias assustadoras, entendo que a Igreja não pode ficar alheia a esse desafio, para não incorrer nos mesmos erros passados, a exemplo do banimento do autor de O fenômeno humano, Teilhard de Chardin, que teve toda a sua linha estudo preocupado em unir a religião com a ciência.
Vale lembrar, que quando do julgamento de Galileu, o cardeal Belarmino recusou-se a ver no telescópio do cientista a demonstração de sua tese. Optou por manter-se fiel aos seus dogmas. Sua atitude estava consentânea com a época em que vivia. Mas hoje não seria mais aceitável.
Por convicção, como católico de várias gerações, prefiro também refugiar-me na minha fé a discutir alguns dogmas da Igreja Católica. Mas entendo que a Igreja não deve ficar esperando as coisas acontecerem, deve ter uma atuação mais ousada enfrentando esses temas atuais. Como exemplo, cito o debate que houve sobre a fé cristã e a razão, na Universidade Católica da Baviera, entre o então teólogo e cardeal Joseph Ratzinger, depois papa Bento XVI, com o respeitado filósofo e jurista Habermas.
Voltando à obra de Yuval Harari, ali, depois de afirmar que a revolução religiosa da modernidade foi trocar a fé em Deus pela fé na humanidade, o autor faz esta diferença: "Se eu acredito em Deus afinal, foi opção minha acreditar. Se meu eu interior me diz para acreditar em Deus – então eu acredito. Acredito porque sinto a presença de Deus, e meu coração me diz que ele está presente."
O horizonte que se apresenta, a meu ver, é procurar meios de equilíbrio entre a fé e a ciência. E assim caminhará a humanidade.
Por: Lourival Serejo
Lourival de Jesus Serejo Sousa nasceu na cidade de Viana, Maranhão. Filho de Nozor Lauro Lopes de Sousa e Isabel Serejo Sousa. Formou-se em Direito, em
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