Assim que me formei e recebi a carteira de advogado fui para Viana à espera de clientes. Estava com a cabeça cheia de teorias e ainda cultivava minha paixão pelo Direito Penal por influência das aulas do professor Alberto Tavares.
Lá um dia apareceu-me uma causa que me deixou empolgado: fora indicado para fazer a defesa de um parricida. Era um rapaz pobre, lavrador, do interior de Matinha, que havia assassinado o pai com um tiro de espingarda. Mesmo sem honorários, atirei-me ao estudo daquele crime, mais preocupado em buscar explicações na psicologia e na psicanálise do que no Direito. E viajei pelas alturas, por onde me encontrei com Freud e suas elocubrações.
Nesse descortino, não esqueci Dostoiévski e renovei a leitura de Os irmãos Karamázov, em cuja obra o autor aborda, de forma genial, um parricídio, com profundas análises psicológicas da alma dos irmãos assassinos, com destaque para Ivan Karamázov, autor da intrigante declaração: Quem não deseja a morte do seu pai?
Não cheguei até ao fim do processo devido à minha aprovação em concurso para o Ministério Público estadual. Entretanto, aproveitando minhas pesquisas, escrevi um artigo sobre o tema, que foi publicado por uma revista de Vitimologia com o arrogante título de "Formação e desenvolvimento de um parricida".
O parricídio talvez seja um dos crimes de raízes mais profundas. Na busca da sua etiologia surgem cavernas abissais da personalidade do criminoso que desafiam os psicanalistas. Quase sempre é o capítulo final de uma longa história de sentimentos reprimidos.
Nessa busca de motivos, pode-se encontrar respostas que retiram do acusado o estigma de "monstro". No meu livro Casablanca, há um conto – Feliz Natal, papai – em que dois irmãos assassinam o pai na noite de Natal. A ação dos filhos foi movida pelo acúmulo de revolta de tanto apanharem do pai e verem a mãe apanhar do marido, quando chegava bêbado em casa. Inspirei-me num fato ocorrido em Timon.
Se atentarmos bem, no ano que se finda, várias notícias de parricídios foram anunciadas pela mídia, tanto no Maranhão como no Brasil. Nem se diga que é sinal do fim do mundo, apesar do repúdio que provoca. Ao longo do tempo, a humanidade sempre se deparou com esse crime, por motivos políticos ou atinentes à herança; às vezes, por efeito de tóxicos ou por distúrbios psicológicos, como foi o caso do cineasta Eduardo Coutinho, assassinado pelo filho, num surto de esquizofrenia.
A meu ver, trazendo o tema para a minha área, a causa maior está na família. Por isso festejamos tanto a nova família da pós-modernidade, com orientação democrática, em que todos têm voz e cada membro é respeitado pelo que é; onde o diálogo é espontâneo e constante, sem medo; onde a figura do pai se sobressai como agasalhador de divergências.
O assunto daria para consumir muita tinta. Lembrei-me de tecer essas breves palavras movido pela notícia vinda lá de Barra do Corda e que deixou o Maranhão estarrecido. Aliás, não é a primeira vez que aquela cidade surpreende com alguma tragédia: o massacre de Alto Alegre aconteceu pelas bandas de lá e abalou até – e principalmente – o Vaticano.
Lourival de Jesus Serejo Sousa nasceu na cidade de Viana, Maranhão. Filho de Nozor Lauro Lopes de Sousa e Isabel Serejo Sousa. Formou-se em Direito, em
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