Vietnã - 40 anos

     A Guerra do Vietnã marcou minha geração de forma inapagável, até sob o embalo da conhecida música dos Incríveis (Era um garoto...). Nomes como Ho Chi Minh, Vietcong, McNamara, Da Nang, Nguyen Van Thieu, Paralelo 17, B-52, Ofensiva do Tet, napalm, My Lai, rio Mekong,  Saigon, Hanói, general Westmoreland,  Haiphong, Kissinger, Le Duc Tho, todos  eram familiares a nós que acompanhávamos aquela guerra tão distante como se fosse em nossas fronteiras. Talvez pela falta de assunto na imprensa local, censurada pela ditadura, o fervor da nossa juventude era desviado para os embates em outras terras.

     Lembro-me bem da euforia que tomou conta do mundo naquele 30 de abril de 1975, quando foi assinalado o fim daquela guerra estúpida que matou quase um milhão e quinhentos soldados, dentre os quais 58 mil só americanos. Em sua grande maioria, as vítimas eram jovens com menos de vinte anos. A televisão e os filmes eternizaram as imagens daquele dia: os helicópteros militares levando os últimos americanos,  os soldados comunistas tomando  Saigon e os tanques derrubando o portão do palácio presidencial. Era a libertação daquele povo, depois de quinze anos de combates.

     A Guerra do Vietnã foi uma etapa da "guerra fria" e da obsessão americana em combater a expansão comunista. Por essa disposição, criaram a "teoria do dominó", para justificar que a queda do Vietnã nas mãos dos comunistas levaria com ela toda a Indochina (Laos, Camboja, Tailândia e a Malásia). Para conter essa ameaça, jogaram 543 mil soldados naquele inferno e despejaram mais munição do que em toda a Segunda Guerra Mundial.

     A conferência de paz, em Paris, responsável pelo fim da guerra, durou muito tempo, entre idas e vindas de Kissinger e Le Duc Tho. Muitas discussões foram feitas, inicialmente, só para definirem se a mesa de negociações deveria ser redonda ou quadrada. Enquanto isso, os soldados morriam.

     A imagem mais dramática  da Guerra do Vietnã (aliás, dizem que as imagens é que derrotaram os americanos; as imagens ao vivo dos combates e feridos e a reação do povo), até hoje reproduzida, é o grito de terror daquela menina nua, queimada de napalm, correndo na estrada, deixando para trás seu povoado em chamas. Esse fato ocorreu em 1972, na época do recrudescimento dos bombardeios autorizados por Nixon.

     O cinema, até hoje, explora o tema do conflito asiático, em produções brilhantes, dentre as quais se destacaram Os boinas verdes (1968, de Ray Kellogg),     Apocalipse Now (1979, de Francis Coppola), Platoon (1986, de Oliver Stone),  Nascido para matar (1987, de Stanley Kubrick) e Nascido a 4 de julho (1989, Oliver Stone). Não se pode deixar de lado a comédia Bom dia, Vietnã (1987, de Barry Levinson) com a figura inigualável de Robin Williams, recentemente falecido. Esses filmes tiveram o mérito de mostrar a força das imagens do cenário em que se desencadeou aquela guerra. Pelo meu conhecimento, calculo em mais de vinte filmes com a temática do Vietnã. Entre todos, elejo Platoon como o melhor. A leitura do livro contribuiu para essa opção.

     Na literatura, o tema também foi explorado em muitas produções: romances, documentários, história, entrevistas e análises críticas. Dentre os romances publicados no Brasil, cheguei a ler: Mensagem de Saigon, de Danielle Steel; Bao Chi, Bao Chi, de Luís Edgar de Andrade; e Matterhorn, um romance sobre a Guerra do Vietnã, de Karl Marlantes. Merece destaque, também, o documentário de Peter Arnett, Ao vivo do campo de batalha. Atualmente estou lendo La Guerra de Vietnam, de Christian G. Appy, ainda não traduzido. Referente ao tempo da Guerra da Indochina (1946-1954), tornou-se um clássico da literatura o romance de Graham Greene, O americano tranquilo.

     Numa manhã chuvosa, visitei, em Washington, o memorial erguido para homenagear os soldados mortos no Vietnã. Das paredes negras daquele monumento exalava um ar de consternação e melancolia. Fiquei comovido com a história contada ali de que, no período de sua construção,  um jovem deixou, entre os operários, uma moto novíssima como se estivesse deixando um presente para seu irmão, falecido em combate.

     Não há dúvida de que a derrota dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã deveu-se à genialidade estratégica do general Nguyen Van Giap e à consciência política daquele povo pela sua autodeterminação. Os bilhões de dólares gastos não foram suficientes para arrefecer o ânimo dos vietnamitas.

     As lições daquela guerra devem servir de alerta para que os pontos focais de conflitos que ainda existem hoje, em todo o mundo, não venham a alcançar o mesmo nível de insensatez a que chegou a Guerra do Vietnã.

     Publicada no jornal O Estado do Maranhão, em 30.4.2015.

     Por: Lourival Serejo

Vice-presidente do TJ/MA e membro da Academia Maranhense de Letras.

 



Lourival Serejo

     Lourival de Jesus Serejo Sousa nasceu na cidade de Viana, Maranhão. Filho de Nozor Lauro Lopes de Sousa e Isabel Serejo Sousa. Formou-se em Direito, em
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